16 de abril
Para sempre lembrados e lembradas
Protagonizado pela Rede de Mães e Vítimas da Baixada, em parceria com o Centro de Direitos Humanos de Nova Iguaçu e FGB, placa foi instalada na praça dos Direitos Humanos em Nova Iguaçu
Uma pequena obra, com representatividade poderosa e vários significados. Uma placa instalada na manhã do dia 2 de abril na praça dos Direitos Humanos (Via Light esquina com rua Dom Walmor), Centro de Nova Iguaçu, oficializou uma linda iniciativa: demarcar, ainda que simbolicamente, o reconhecimento da cidade pela perda de tantas vítimas assassinadas em função da violência de Estado. A inauguração do memorial fez parte de um calendário de eventos específicos para o fortalecimento da Rede de Mães, tais como a pré-estreia do documentário Nossos Mortos Têm Voz, a caminhada pelos 13 anos da “Chacina da Baixada”, o Encontro Estadual de Mães Vítimas da Violência, além do lançamento da publicação “Cartografia Social: o impacto da militarização na vida das mulheres da Baixada Fluminense”. Para salientar essa importância, estiveram presentes representantes do Centro de Direitos Humanos de Nova Iguaçu, Fórum Grita Baixada, prefeitura de Nova Iguaçu, além de movimentos sociais de outras partes do Rio de Janeiro.
E foi a hora das mães se fazerem representar como protagonistas de fala. Luciene Silva, contou que em termos de organização, a Rede de Mães vem apresentando novidades: “A Rede está se estruturando, nosso objetivo é nos tornarmos independentes, ter mais autonomia. Mas como foi dito aqui sozinhas não vamos conseguir. Precisamos de ajuda para que ela se fortaleça, para que consigamos continuar com nossos trabalhos de mobilização, articulação e incidência política.
O vice-prefeito de Nova Iguaçu, Carlos Ferreira, disse que a instalação daquele memorial seria “um laço para fortalecer a luta dessas mulheres”. “Assim como elas, precisamos lutar por uma cultura de paz que se sobreponha à violência que vivemos em nosso dia-a-dia. Não podemos deixar que mais jovens negros morram, sem pedir para as autoridades que tomem as devidas providências para que essas mortes diminuam. O nosso governo está fazendo a sua parte, pois está retomando a pasta da Secretaria de Direitos Humanos, algo que não tínhamos a um certo tempo”. – afirmou Ferreira.
A coordenadora executiva do Centro de Direitos Humanos de Nova Iguaçu (CDHNI), Aparecida Pontes, disse que apesar daquele memorial expressa um momento de aparente luto para aquelas mães, “é com alegria que o CDH via iniciativas como aquela”. “Nós estamos aqui não apenas para participar dessa homenagem, mas dizer que estamos sempre de portas abertas para acolhê-las. Não queremos mais mortos. Queremos que prevaleça o sentimento de que cada um nessa cidade e em qualquer território da Baixada se sinta acolhido com as nossas políticas”, disse Aparecida. Após o seu discurso, ela pediu um minuto de silêncio em respeito aos que morreram.
A articuladora de territórios do FGB, Lorene Maia, além de, também, agradecer a iniciativa de lutas da Rede de Mães, disse que a inauguração do memorial traz fortalecimento e possibilidades para que a justiça se faça mais presente em situações em que as populações mais pobres são mais vulnerabilizadas pela violência de Estado. “Como mulher, me sinto muito agraciada em participar dessa luta. Obrigada por vocês terem me apresentado a ela”.
Tatiane Rose, representante do núcleo Baixada Fluminense do movimento social “Quilombo Raça e Classe”, com 10 anos de existência no Rio de Janeiro e filiado à Central Sindical e Popular Conlutas, disse que a identificação com as razões e emoções que motivam a Rede de Mães nessa saga contra o avanço da violência é mais do que uma mera proximidade. “Elas são mães guerreiras. Me vejo no lugar delas. É duro você andar em uma sociedade que, ao detectar a sua cor, já pensa que você vai roubar, assaltar. É duro você ser julgado por antecedência. Eu sei o que são a fome e a pobreza. Cada vez que nós ligamos a TV, vemos o sangue dos nossos jovens na tela”, disse Tatiane em um discurso emocionado.
Outra ativista social presente na inauguração do memorial foi Valmíria Guida, do movimento negro Minervino de Oliveira, cujo nome advém do primeiro negro candidato à Presidência da República do país, pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), em 1928, e que definiu como “antirracista, anticapitalista e antiimperialista”. Ela construiu sua fala mais calcada na conjuntura política atual, repleta de pertinentes preocupações. “Todas nós temos um compromisso com esse memorial. A Baixada Fluminense, assim como o Estado do Rio, está tomada pelo fascismo e a repressão. O sistema capitalista faz com que se perpetue isso. Os movimentos sociais precisam se fazer mais presentes nessa arena. Mas não estou falando de disputas. Temos que buscar a nossa universalidade para procurarmos ser uma só voz nesse processo”. Disse Valmíria ao site do Fórum Grita Baixada.
Dados sobre a violência na Baixada
Segundo levantamento feito pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) apenas no mês de setembro de 2017, a Baixada Fluminense havia registrado 180 homicídios. Considerando a série histórica, que abrange o número de ocorrências em um espaço de um ano, quase 2.300 pessoas foram assassinadas em circunstâncias violentas apenas no ano passado, considerando os indicadores de letalidade violenta, cujas modalidades de óbito englobam homicídio doloso, homicídio decorrente de oposição à intervenção policial, latrocínio (roubo seguido de morte) e lesão corporal seguida de morte. Outro levantamento, desta vez realizada pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN), revelou que das 21 áreas onde há mais homicídios dolosos na área que envolve Rio e Região Metropolitana, oito estão na Baixada Fluminense.
Entretanto, a interpretação sobre um potencial cenário de violência pode mudar quando os dados apresentados alimentam indicadores que não englobam necessariamente perdas de vidas humanas de forma violenta. É o que aponta um outro estudo do ISP, dessa vez sobre os roubos de mercadoria em logradouros públicos (ruas). A validade desse indicador é um somatório de vários tipos de roubo, como roubo a transeunte, roubo de aparelho celular e/ou roubo em coletivo.
Segundo a pesquisa determinado tipo de violência cai no Estado, nos últimos três meses de 2017 em relação ao ano anterior, puxados principalmente pela queda destes crimes na Baixada Fluminense. Em dezembro de 2017 foram registrados 1.279 roubos a menos, uma redução de 11,8%, em relação ao mesmo mês de 2016. Na área do 20º BPM (Nova Iguaçu, Mesquita e Nilópolis) foram cerca de 470 roubos a menos nessas áreas, o que representa 46% da redução total.