18 de dezembro de 2019
Golfinhos da Baixada realiza roda de conversa sobre violência e racismo na Baixada Fluminense
“Afro Papo”, mais uma parceria com o FGB, promove debate em torno da violência de Estado, acesso a esporte e lazer e a situação cotidiana da mulher baixadense e do público LGBTQIA+.
O Centro de Treinamento Golfinhos da Baixada, em parceria com o Fórum Grita Baixada realizou, na quinta-feira (12/12/19), em Queimados, a roda de conversa “Afro Papo”, evento que possibilitou debates em torno da violência de Estado, do acesso ao esporte e ao lazer, além da situação cotidiana da mulher e outras questões de gênero pela ótica baixadense.
Para compor a mesa foram convidadxs, Gisele Castro, historiadora da Arte e coordenadora do Golfinhos da Baixada, Olga Silva, pedagoga do Núcleo de Atenção à Violência (NAV) e João G. Júnior, professor, historiador, poeta e ativista LGBTQIA+. A mediação ficou com Sônia Martins, professora e membro da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Antes de começar o debate, foi feita uma mística protagonizada pela militante Maria Betânia, integrante do Comissão Pastoral da Terra, que entoou versos de uma poesia. Logo após, começando as discussões, Olga, mencionando o educador Paulo Freire, afirmou que, considerando o contexto histórico em que este é tão atacado, ela sempre desenvolveu o seu pensamento educacional numa perspectiva que “muitos militantes deveriam aprender a alinhar suas convicções dentro daquilo que se fala e faz”. “Atualmente, é preciso fazer um esforço para se desafiar, para experimentar um lado da história talvez um pouco mais obscuro, mas que exige mais do que enfrentamento, mas a capacidade de persistir dentro daquilo em que se acredita”, disse Olga.
Após a exibição do vídeo clip “Nome das Favelas”, do sambista Moisés Marques, foi a vez de Gisele ter seu momento de fala. E foi justamente para narrar suas origens em uma favela do Complexo do Alemão, é que veio a oportunidade de expor suas memórias e como elas acabaram por influenciar o seu trabalho. “Nós do Golfinhos da Baixada, lutamos pela garantia de direitos. Não fazemos caridade, nós promovemos responsabilidade social. O que fazemos em nossa cidade tem impacto direto nos nossos vizinhos, nas nossas crianças. Trabalhar em projetos sociais é muito desafiador, ainda mais considerando o cenário político atual.
Encerrando os lugares de fala, o professor João afirmou que a expressão Direitos Humanos não deveria pertencer a nenhuma cartilha político-ideológico-partidária específica, já que todos são afetados quando estes direitos são desrespeitados. Ele utilizou como exemplo, uma realidade que é bastante peculiar na Baixada Fluminense: o transporte público. “O direito à vida passa por violações cotidianas como, por exemplo, você esperar duas horas por um ônibus para se deslocar pro local de trabalho e ele já vem lotado e sucateado. Ou então quando você precisa lutar dentro de sua própria família para anular generalizações heteronormativas em função de sua sexualidade. A normatização, que também é feita em muitas escolas, é uma forma de controle, poder e constrói processos perversos de exclusão também”, afirmou o militante.
Sobre o futuro
Quando se aproximou a hora da rodada de perguntas, FGB se propôs a indagar uma questão bem desafiadora. Como, considerando um ano especialmente difícil para defensorxs de Direitos Humanos em relação a uma série de retrocessos promovidos pelos governos federal, estadual e municipal, os participantes enxergam um futuro próximo? Eis o que eles responderam:
Olga: “Eu tenho uma esperança de que um dia a gente entenda que o sistema de opressão é o mesmo. Pra isso, temos que eliminar as divergências. A fragmentação enfraquece demais e, por isso, temos que identificar todos os sistemas de opressão e canalizar todas as nossas energias e forças contra eles. Coisas inacreditáveis aconteceram esse ano, mas precisamos continuar acreditando nas possibilidades”.
Gisele: “É um questionamento muito presente na vida da militância. Conversando com algumas pessoas em diversos encontros, eu percebo o quanto elas estão fragilizadas, cansadas, profissionalmente, fisicamente. Mas eu tenho uma perspectiva positiva do futuro quando estou nesses momentos de conversa e de troca. É quando eu consigo recarregar as minhas energias, o trabalho que a gente tem feito aqui”.
João: “O que assusta é que as minorias estão perdendo as origens de sua construção identitária, através de processos de apagamento e de não identificação ou não reconhecimento ocasionando em parcerias que, há algum tempo atrás, seriam consideradas bizarras, como homens negros votando em presidente ultra-conservador, mulheres votando em candidatos misóginos, homossexual fazendo campanha para LGBTfóbico. Porque o discurso deles foi desconstruído, a memória histórica foi destruída e reconstruída. Temos que estar juntos e isso não está acontecendo. São grupos que, às vezes interferem nas lutas de outros grupos, e isso está errado”.
Sônia: “Eu acho que estarmos aqui participando desse momento, com essa coletividade é, de certa forma, é experimentar uma vivência de construção do presente para se vislumbrar o futuro.